O tempo da Quaresma
Por Glêvison Felipe*
Antigamente, a Quaresma era o período durante o qual, através da penitência e da provação, os catecúmenos se preparavam para receber o batismo na noite da Páscoa.
Iniciando na Quarta-feira de cinzas o Ciclo da Páscoa, que abrange o tempo da Quaresma, a liturgia nos convida a renovar e a reavivar em nosso coração as disposições que pronunciaremos, durante a Vigília Pascal, na renovação das promessas do nosso batismo.
Celebrar a eucaristia no tempo da Quaresma significa percorrer com Cristo o caminho da provação e da dor, dando-lhe novo sentido a partir do Mistério Pascal da sua Paixão, Morte e Ressurreição.
1º Dom. Quaresma Ano C
Celebrando o Primeiro Domingo da Quaresma, a liturgia nos conduz pela experiência do Povo de Deus e de Jesus Cristo através do dom da libertação e do compromisso com a Aliança salvífica de Deus. Cristo liberta de todas as prisões; do pecado, do egoísmo… e para isso contamos com o sustento da graça divina na superação de todas as tentações que nos desviam do Caminho, da Verdade e da Vida.
1ª Leitura (Dt 26, 4-10)
O Povo de Israel viveu a experiência de libertação, tendo como evento fundador da sua fé a passagem do Mar (Ex 14). Aí está a sua referência para terem consciência de que eles são o povo escolhido e que a sua libertação é um prodígio de Deus e não iniciativa humana. Por isso a sua religião se baseia nessa libertação e no seu desenrolar dentro de um projeto de salvação.
2ª Leitura (Rm 10, 8-13)
As comunidades que se reúnem em nome de Jesus professam a “Palavra da fé” nele, ressuscitado pelo poder do Pai, como os israelitas celebravam a Páscoa reconhecendo os prodígios de Deus para com eles. Portanto, para nós cristãos, o evento fundador da nossa fé é o Mistério Pascal de Cristo (Paixão-Morte-Ressurreição).
Evangelho (Lc 4, 1-13)
Os evangelhos sinóticos (Mc, Mt, Lc) fazem das tentações um padrão de toda a vida de Jesus; mas Lucas tem suas particularidades: só ele, por exemplo, fala que o diabo se retirou, mas que iria voltar (v.13). Isso indica que a caminhada apenas começou e que o encontro final se dará em Jerusalém (Lc 22, 3.53), como aliás é a trajetória do evangelho de Lucas: uma subida para Jerusalém.
Jesus é levado ao deserto para aí ser tentado durante 40 dias, como Israel em outra oportunidade também foi provado (Dt 8,2). Aí Jesus conhece três tentações enumeradas pelas citações de Dt 6 – 8, trecho que é a moldura do mandamento de amar a Deus. Logo, a vigilância é contra a tentação de “não amar a Deus”. Não amar a Deus “de todo o coração” ou seja, o coração, local da decisão está cheio dos meus próprios desejos; não amar a Deus “de toda a sua alma”, ou seja, com a vida, com o corpo físico; não amar a Deus “com toda a sua força” ou seja, com minhas riquezas, posses, bens externos. No fim, Jesus aparece como aquele que ama Deus perfeitamente.
Observamos que as tentações do deserto são as tentações do homem moderno, que dificultam o avanço da humanidade no caminho do amor. Transformar pedra em pão (tentação do prazer / concupiscência da carne); ser dono dos reinos do mundo (tentação do ter); Dar ordens… (tentação do poder).
Outro ponto interessante é que o diabo diz a Palavra de Deus, citando um trecho do Salmo 91. Sinal de que não basta conhecer intelectualmente a Palavra de Deus, mas o essencial é trazê-la ao coração e à vida…
_____________________________________
* Glêvison Felipe é diácono permanente da Arquidiocese de Belo Horizonte. Graduado em Engenharia Civil, concluiu o Curso de Teologia Pastoral na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia – FAJE-BH. Membro do Movimento Bíblico Nova Jerusalém em Vespasiano (MG).